Por Delmiro Campos*

Às vésperas do novo ano, as discussões políticas ganham força em torno das candidaturas às presidências das câmaras municipais. Apesar de algumas legislações locais permitirem reeleições sucessivas, o Supremo Tribunal Federal (STF) já se posicionou firmemente contra essa prática, delimitando a possibilidade de apenas uma recondução consecutiva. Esse entendimento, consolidado em diversos precedentes, reforça os princípios republicano e democrático, pilares da alternância no poder e da temporariedade nos mandatos.

No julgamento da ADI 6.524, o STF estabeleceu que a recondução ao mesmo cargo em Mesa Diretora só é permitida uma vez, seja dentro da mesma legislatura ou em legislaturas distintas. Essa decisão visa preservar a alternância de poder e a temporariedade dos mandatos, limitando reeleições sucessivas que poderiam comprometer o equilíbrio democrático. A Corte enfatizou que, embora estados e municípios tenham autonomia legislativa, esta deve estar subordinada aos princípios constitucionais que regem o pacto federativo.

Outro marco relevante foi o julgamento da ADPF 959, que abordou a Câmara Municipal de Salvador (BA). No caso, tanto a Lei Orgânica quanto o regimento interno permitiam reeleições ilimitadas, mas o STF restringiu tal prática, estabelecendo que apenas uma recondução consecutiva ao mesmo cargo é admissível. Para garantir segurança jurídica, foi fixado o marco temporal de 7 de janeiro de 2021, data de publicação da ata de julgamento da ADI 6.524. Assim, eleições realizadas antes dessa data não contam para fins de inelegibilidade, mas qualquer violação posterior ao marco está sujeita à anulação.

Na ADI 6.688, o STF também abordou a modulação de efeitos temporais, reforçando que as decisões devem proteger a segurança jurídica sem retroagir para impactar composições legitimamente eleitas em períodos anteriores ao marco temporal. Com isso, a Corte reforçou sua postura de estabilidade e previsibilidade jurídica, especialmente em matérias que afetam as direções legislativas.

A discursão jurídica está posta e a política está em polvorosa muitas vezes sem qualquer alinhamento com as orientações do STF. 

Já é comum vermos encerradas as eleições dos primeiros biênios de cada legislatura os arranjos em torno das antecipações das eleições das mesas diretoras e há quem defenda ser algo importante para o equilíbrio político das casas legislativas.

Acontece que a prática de antecipar essas eleições também tem sido alvo de decisões críticas por parte do STF. Na ADI 7.737, referente à Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), a Corte declarou inconstitucional a resolução que permitia a realização de eleições para o segundo biênio ainda no primeiro ano da legislatura. Essa antecipação excessiva foi considerada incompatível com os princípios da contemporaneidade e da representatividade.

O STF entendeu que o intervalo excessivo entre a eleição e o início do mandato prejudica a avaliação das forças políticas que, por sua natureza, podem se alterar ao longo da legislatura. Ao realizar eleições tão distantes, as casas legislativas ignoram possíveis mudanças no cenário político e dificultam a oxigenação democrática, favorecendo a perpetuação de grupos políticos no poder. A decisão reforçou que a legitimidade de qualquer mandato está diretamente vinculada à contemporaneidade do processo eleitoral.

Esses precedentes devem servir como guia para que câmaras municipais e assembleias legislativas ajustem suas práticas, observando rigorosamente os limites constitucionais. Tanto a reeleição ilimitada quanto a antecipação desarrazoada de eleições são práticas que expõem as instituições ao risco de judicialização e de comprometimento de sua legitimidade.

O STF não apenas delimitou com clareza os parâmetros constitucionais, mas também reafirmou que os processos internos das casas legislativas precisam refletir a realidade política do momento.

*Advogado